Diariamente, enquanto Gays, somos afrontados, insultados e humilhados pelas mais diversas pessoas e nas mais diversas formas.
A intolerância vai grassando por este mundo. Torna-se então necessário que nos organizemos e nos expressemos de forma colectiva para reivindicar direitos que nos são negados e que não deveriam sequer suscitar discussão.
Ontem estive na Marcha LGBT Lisboa, quis juntar a minha presença e a minha voz ao clamor para que nos sejam reconhecidos direitos iguais e para que a nossa sexualidade não seja uma barreira para que isso aconteça.
Confesso que ponderei bastante sobre a minha participação nesta marcha, não porque não ache que ela não se deva realizar ou porque não tenhamos mesmo que chamar a atenção do mundo para os recordar que também somos cidadãos, que temos deveres iguais e por conseguinte queremos direitos iguais. Não, a minha relutância vai quanto ao conteúdo e à forma de expressar o protesto.
É que, da mesma forma que não gosto que me chamem “fufa” em tom depreciativo, também não posso ir gritar pelas ruas de Lisboa “mulher verdadeira, é fressureira” ou “homem verdadeiro, leva no pandeiro”. Este tipo de afirmações desrespeita também os demais e não nos coloca numa posição reivindicativa séria.
Este é o tipo de afirmação que não nos leva a lugar algum. Temos que nos fazer ouvir, reivindicar, lutar, mas temos que ser sérios e coerentes nessa tarefa. Acima de tudo, não podemos ser injustos, rotuladores e julgadores se é precisamente contra isso que lutamos. Persistir neste tom reivindicativo é mantermo-nos no ghetto, isolados dos demais; porque às tantas há a tendência até para nos julgarmos melhores que os outros, o que também não é verdade.
Não sou apologista do “olho por olho, dente por dente”. Não me considero mais mulher por amar outra mulher. Sou uma mulher igual a qualquer outra.
Da mesma forma que quero que me respeitem pelas minhas opções, também devo respeitar as dos outros.
Prefiro de longe outros slogans que foram utilizados, como: Sim! Sim! Sim! Nós somos assim!
13 comentários
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Junho 30, 2008 às 9:58 am
sérgio vitorino
lol, e achas que esse slogan das panteras é um olho por olho? Não, reflecte melhor, é uma ironia que questiona os papeis formatados de homem e mulher, a masculinidade macha dominante, o país do macho latino ou que ainda distingue entre boas e más mulheres.
Questionar o gueto é também quebrar as suas fronteiras, e isso não passa só por pedagogia, por vezes necessita também de provocação.
É bonito o respeito, mas a homofobia não é respeito, e vivemos num país em ela ainda é dominante. Questioná-la é não só querstionar as caixinhas supostamente estanques das orientações sexuais mas também o binarismo de género e o machismo da sociedade portuguesa.
É evidente que esta palavra de ordem é uma provocação de carga irónica. Quem ouviu as nossas palavras de ordem, ouviu outras como “O homem é assim, a mulher é assado, é o sistema do género formatado”…
E a diversidade de que reclamamos a comunidade lgbt, deve reflectir-se tb na marcha, ela tem de ser espaço de opiniões e abordagens diferentes 🙂
Penso eu…
sérgio vitorino
Junho 30, 2008 às 10:52 am
Maria Oliveira
sem dúvida que a marcha tem que ser um espaço de opiniões e abordagens diferentes, aliás, essa é a sua essência, quando saímos para a rua, nos mostramos e dizemos, estamos aqui a lutar pelos nossos direitos. claro que a homofobia deve ser exposta e questionada a todo o momento para que não restem dúvidas de que ela existe de facto e deve ser erradicada.
eu pessoalmente entendo perfeitamente o sentido irónico dado a esses slogans, eu própria ri quando os ouvi, só não tenho a certeza é que as muitas pessoas que assistiram à nossa passagem pelas ruas de Lisboa tenham entendido o alcance dessas frases da mesma forma, e é aí que eu acho que devemos ser cuidadosos na abordagem e evitar aquilo que eu acho ser o “olho por olho”, na medida em que não temos que utilizar as mesmas armas nem o mesmo tipo de ataque verbal, de resto, venham as diferentes abordagens e opiniões, sempre!
viva a diferença!
Junho 30, 2008 às 12:45 pm
tangas
olá sérgio. viva a diferença!
com toda a franqueza, adorei a irreverência das palavras de ordem. achei que tinham tudo que ver com a juventude do que é hoje o movimento lgbt.
porque eu, que tenho cinquenta anos e vivi a maior parte da minha vida a ter cuidado com o que dizia, acho de uma frescura impressionante observar as novas gerações a usarem a sua liberdade de expressão da forma que mais lhes agrada.
compreendo a posição da maria, que é uma pessoa mais conciliadora (mas muito aguerrida também na sua forma de estar). e, de novo, viva a diferença!
Julho 1, 2008 às 8:42 pm
rosa-que-fuma
olá!
Acerca das palavras sujas, passo-te uma reflexão que li anteontém a propósito do congresso feminista:
a palavra mulher, e também rapariga, até há bem pouco tempo (e diria ainda) foram palavras sujas, em relação às correctas menina e senhora. Mulher é mesmo ainda intercambiável com esposa, desrespeitando a estrutura latina (marita, marida), e em mulher-a-dias parece indicar imediatamente uma função quase-biológica.
Feminista também foi pelos vistos para a geração precedente, uma senhora com pés grandes e bigode. Uma sapatona, certamente.
No estudo masculino/feminino de ligia amâncio está muito bem expressa esta “realidade discursiva”, em que certas palavras se tornam sujas simplesmente por serem pronunciadas no feminino, em que palavras elogiosas há (porque são usadas pelos entrevistados) em maior quantidade para masculino, e desprestigiantes para feminino.
Não me estendo mais, quis apenas partilhar como respondo em mim mesma ao que perguntas a ti também.
Outra coisa que acho importante também, é que na manifestação está em causa quem agride e quem é agredido na lógica quotidiana. Todas aquelas pessoas, que são agredidas por certas razões, trocam de lugar com o agressor. Mesmo. É o lugar de fazer isso mesmo. Por isso acho tão mal que se chateie a malta mais carnavalesca. Acho essencial sacrificar um poucochinho da “seriedade” política (que está assegurada o resto do anos) para que as pessoas se expressem com o maximo de vivacidade e satisfação. A marcha é para ti, usa-a!
Julho 11, 2008 às 6:08 pm
sérgio vitorino
rosa-que-fuma, those could be words of mine. Só que tu dizes melhor 🙂
Respeito e abraço 🙂
Julho 12, 2008 às 1:19 pm
Maria Oliveira
rosa-que-fuma, pegando nas suas palavras, encontro precisamente aquilo que eu acho que está errado, e que foi a razão pela qual eu afirmei que não sou apologista do “olho por olho, dente por dente”, que é nada mais nada menos do que esse princípio que defende de que na marcha o agressor e o agredido trocam de lugares.
eu não quero trocar de lugar com ninguém. quero o meu próprio lugar, e não só não quero que me agridam como também não quero agredir para o ocupar.
dê uma vista de olhos pelas noticias, comentários e reflexões feitas a propósito da marcha nos media e na blogosfera, e diga-me, se não foram precisamente essas as frases que foram mencionadas e utilizadas contra nós de forma negativa, acusando-nos de querer impôr as nossas práticas.
resumindo, acredito que nos temos que afirmar pela positiva, nunca pela negativa e nem recorrendo às mesmas tácticas dos nossos agressores!
nota: uma amiga contou-me que o pai lhe perguntou se ela achava mesmo que eles – o pai e a mãe dela – teriam que mudar de práticas sexuais para se tornarem homem e mulher verdadeiros…
Julho 18, 2008 às 4:04 am
x-pressiongirl
Compreendo bem a “comichão” que faz usar-se slogans destes. Quando os encontrei na marcha também me choquei porque lá está, ficamos sempre com medo do que os outros vão pensar. Temos sempre aquele receio parvo: vai passar na televisão, vai tirar-nos credibilidade… Mas durante a marcha pensei “que se f***, estou farta de vestir a pele de coitadinha. Vamos mas é brincar com os estereotipos.” É esse o exercício que as panteras fazem e apesar de me chocar demasiadas vezes com as panteras (às vezes só me apetece é dar-lhes um tapa na pantera – http://www.youtube.com/watch?v=6rMloiFmSbw ) gosto da provocação porque ela é necessária. Concordo em pleno com rosa-que-fuma (como é que queres fazer, rosa, envias-me o cheque ou fazes transferencia?).
Besitos x-pressivos da grande bichona que há dentro de mim,
x-pressiongirl 😉
Julho 18, 2008 às 4:06 am
x-pressiongirl
Esqueci-me de dizer uma coisa: o slogan que preferes “Sim, sim sim, nós somos assim!” Que mensagem transmite isto? Para se gritarem mensagens batidas e de conteúdo vazio mais vale ficarmos calados, é por isso que normalmente prefiro as pancartas e boa música para a cabeça. 😉
Julho 18, 2008 às 11:28 am
Maria Oliveira
ainda bem que compreende a “comichão” x-pressiongirl. sabe do que falo portanto.
mas não mencionei o assunto por ter medo do que os outros possam pensar, e não visto a pele da coitadinha. eu também me diverti com esses slogans, como aliás mencionei no post, mas outra coisa é analisar o efeito que eles possam ter, porque embora não nos tirem a credibilidade, continuo a achar que a abordagem tem que ser outra; directa, afirmativa, provocatória, mas não de confronto.
“Sim, sim sim, nós somos assim!”, é uma frase afirmativa, positiva e também provocatória, gritada para quem nos viu e ouviu passar, afirmando que sim, somos assim, lgbt. outras haveria, esta foi só um exemplo.
um abraço não menos expressivo! 😉
Julho 18, 2008 às 2:51 pm
rosa
Maria
se se divertiu, tanto compreende a comichão como o prazer, tanto se pôs na pele de um lado como do outro. Muito bem, para mim é assim que se pensa.
Mas escolheu um dos lados, não me tome mal, não a julgo, argumento.
“não quero agredir para o ocupar.”
repare, é como chamar puta á puta, ou preto ao preto. Quem vive as coisas toma as palavras diferentemente de quem se opõe à existencia destas pessoas.
já ouviu falar da associação ni putes ni soumisses?
Isto para mim faz a diferença. Tomar o discurso violento que é feito sobre si (mim) na minha própria boca, é radicalmente diferente de olho-por-olho-dente-por-dente.
Sabe que os heteros, copiosos praticantes de sexo anal, dizem “daqui só sai, não entra”. porquê? diria que é identitário (homem verdadeiro não leva no pandeiro/mulher leva no pandeiro/vai apanhar no pandeiro….)
o cenário de violencia gratuita é onde nos movemos. Precede-nos. Eu sei que doi demais ter consciencia disso. Voce pode (e faz-lhe bem) construir um cenário à parte, mas.
Julho 18, 2008 às 3:11 pm
anon
Na marcha, cheguei-me ao pé de um dos moçoilos jovens que gritavam esses “slogans”, de cartaz na mão, disse-lhe, com calma e simpatia, que talvez o efeito não fosse o melhor, não sei…, e a resposta foi…
“Se não estás bem, vai-te embora, fufa armariada…” (sic)
Julho 18, 2008 às 4:12 pm
Maria Oliveira
Rosa
para si pode fazer toda a diferença tomar na sua própria boca o discurso violento que fazem sobre si. para mim não faz qualquer sentido.
não vejo que esse seja de forma alguma o caminho.
violência só gera violência.
no meu cenário à parte, como lhe chama, não agrido, e também com menos probabilidade serei agredida. na certeza porém que, se for agredida, também me terei que defender e saberei como o fazer, não duvide.
Julho 18, 2008 às 5:00 pm
anónimo
Percebo bem o que quer dizer. Quanto a mim sou um adolescente gay e também não gostaria que me chamassem “paneleiro” em tom depreciativo…
Estas marchas são das poucas coisas que temos para chamar a atenção dos outros à nossa causa, mas não a “mandar vir” e com ar de superioridade, pois somos todos iguais. Por isso concordo quando fala em organizar e apresentar de uma forma séria aos outrosas nossas intenções.
Parabens pelo artigo bem escrito.